terça-feira, 3 de novembro de 2009

3x4.

Eu aqui, remexendo em coisas velhas, tentando talvez encontrar o apalpar daquilo que há muito só vaga e se esconde por trás de uma vidraça que permite ver o que não se pode tocar, tentando talvez me esconder em meio a velhas entranhas, tentando talvez me fazer viver, talvez pelo simples fato de existir um talvez, talvez porque eu soubesse que encontraria sua foto. Uma linda foto que um dia você me deu; (daquelas que se tira quando criança e se guarda pra depois ver que o olhar não é mais tão puro; que o meio sorriso não se contém; que os cabelos são tal como eram quando você nasceu). Uma linda foto. Retirei mais alguns trapos... Uns bilhetes de amores de infância, papel de bala, flor, clips, dente de leite, palito de picolé, coleção de selos, postais... seu retrato. Estava ali, ainda virado, como quem não quer se mostrar. Mas eu sabia que era o seu retrato; sabia porque era o único que eu havia guardado naquela caixinha de lembranças-pensamentos. -Sim, lembranças ou são lembranças-pensamentos, ou são lembranças-lembranças. Há sempre aquilo que você se lembra com tamanha força, com tamanho sentimento, com tamanha concretude, que acaba por ignorar o caráter efêmero que todas as coisas deveriam ter, e têm. Mas você não as permite. -Digo você, mas eu não as permito. Essas coisas, essas lembranças, essas que você não deixa de tentar tocar, dessas que te arrancam um sorriso e depois te escapam uma lágrima, essas são as lembranças-pensamentos. As outras você só se lembra em alguma data, não deseja reviver. E a sua foto estava naquela caixinha. A de 'lembranças-pensamentos'. Peguei aquilo com tamanha dor, com tamanha ira, com tamanho medo. Virei aquilo com tamanho receio. Olhei aquilo com tamanha culpa! Culpa de estar olhando. Culpada por desejar mais uma vez, culpada por te amar mais uma vez. Guardei aquilo. Nessa hora eu pensava: 'É só uma foto. Ela não está aqui. Você já estava se curando. Não beire ao precipício. Controle-se. Ela não vai voltar. Acalme-se. Muita calma. Calma.' Fechei aquela caixa com tamanho desespero! Fechei pra depois abrir como um selvagem, pra atirar todas as lembranças e descartar todo o passado. Peguei o retrato com tamanha fúria! Desfiz com fogo cada bilhete, cada selo, cada parte de seu rosto em imagem. Daqui pra frente quero te lembrar em uma data, quero não te desejar reviver. Quero-a morta em pensamento. Quero tê-la apenas como lembrança. Uma velha memória do que não de fato aconteceu.

2 comentários:

  1. Até que fim eu consegui! ^^ Tinha que comentar nesse texto aqui. Foi ótimo estar em sua cia enquanto você o escrevia, foi um privilégio! O texto, como todos os outros, está ótimo! E quanto a caixinha... aii aii, você já sabe! =P É isso, sucesso sempre! ^^

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  2. "Fechei pra depois abrir como um selvagem, pra atirar todas as lembranças e descartar todo o passado." ... Não preciso falar mais nada.!

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