terça-feira, 5 de junho de 2012

putrefato.

Pareço uma desgraça. E o pior é que estou gostando do sabor disso. Estou bebendo do meu sangue. Tirando as forças pouco a pouco. E, de repente, me vejo colocando meu veneno na estante. Para tomar gole a gole e, de hora em hora, um tanto mais. O que me diferencia dessas criaturas gélidas é que eu não brilho. Ao contrário, me ofusco. Tomo um conhaque para esquentar o peito, já que sangue não possuo mais. Nem sangue e nem corpo e nem alma e nem fogo e nem brilho e nem n-a-d-a. É vazio. Mais nada além de vazio. Agora a dor vem pungente. Dando pontadas no coração que já não me pertence. Nem por milagre e nem por fé e nem por culpa eu posso mais. Chega. Suspiros irrompem. O frio castiga. A coberta não aquece. Os trapos estão por ai. Cuidei enquanto pude de todo o meu caminho. Segui a estrada parando de esquina a esquina para tomar uma dose de pinga. Mas as madrugadas continuavam geladas, não importava o quanto eu bebia. Por isso o sangue. Para alimentar e aquecer e tentar, talvez, preencher tanto espaço. Exaustão. Covardia. Pessimismo. Solidão. Esse é o meu retrato, bem simples. Pareço uma desgraça. Uma podridão. Uma criatura que chora sem exigir o por quê de derramar cada lágrima. Chega a ser uma estupidez. Um pensamento fétido, mas, se eu nasci só, tenho que chegar ao fim igualmente só. Unida apenas de nostalgia, carne crua, conhaque fudido, cigarro achatado. Eu, eu não passo de um vampiro que bebe o próprio sangue e paga alto por se alimentar de si mesmo.  Eu não passo de uma coisa perdida, perdidamente pronta para se entregar.